Quando falo com as pessoas sobre fazerem sua parte para a sustentabilidade da vida, do planeta, do ser humano, muitas pessoas comentam que existem coisas que elas gostam muito de fazer e lhes seria difícil abrir mão em prol do nós. Percebo nelas o desejo forte de manter as vontades que elas têm e sentem que lhes são de direito, como um pagamento que cobram por estarem vivas e fazerem os seus deveres. São as chamadas indulgências.
Essa percepção me vem acompanhando há tempos e creio que agora entendi que talvez haja por trás dessa atitude e comportamento a imagem de que viver é um sacrifício. Assim, já que estou me sacrificando, tenho direito a uma recompensa. Para aqueles que pensam assim, por mais íntimo que seja este pensamento, gostaria de lhes pedir uma reflexão sobre esse pensar. Acredito que essa crença não contribua em nada. Não ajuda a pessoa, não ajuda as pessoas que a rodeiam e muito menos ao mundo. Se sentir vítima só traz para si o sentimento de injustiça – se não, não haveria vítima – e desenvolve na pessoa a crença que merece mais os céus do que os outros. Acredito piamente, que o sacrifício não eleva. A gente não fica mais boazinha através do sacrifício. Acredito que não há um prêmio maior nós aguardando nos céus. Talvez isso venha, no nosso caso ocidental, de uma doutrina cristã e católica, que já impôs a nós crenças que até hoje nos conduzem e algumas delas, infelizmente, não fazem mal.
Acredito que na realidade o ato bom, bondoso se realize por atender um desejo que vem da alma, em fazer o bem. Não é uma troca que depois iremos cobrar. Quando estamos com esse desejo no coração e conseguimos manifestá-lo, não há nenhuma sombra que lembre sacrifício. Pelo contrário, há um prazer imenso em atender esse pedido da alma. O coração se emociona, e a gente fica com uma satisfação tão grande de nosso ato, com tanto orgulho de nós mesmos, que ao final, queremos mais é pedir agradecimentos ao outro por nos permitir viver isso.
Parece sublime demais? E é. E está ao nosso alcance. Simples.
Hoje agradeço a criação japonesa que recebi da minha mãe. Onde o dever esta acima do eu. Onde o nós está acima do eu. Com os anos limpei a ‘honra’ de me sacrificar que essa cultura traz muito forte. Entendi que o sacrifício não me elevava, mas me revoltava. E hoje, limpa essa parte, vejo que sobrou o prazer pelo dever cumprido. Prazer que infelizmente quase não percebo nas pessoas. Nem as vejo desenvolvendo isso nos seus filhos. Infelizmente, o que mais vejo é a revolta; e por isso cobram sendo indulgentes com eles mesmos, ‘porque têm direitos’ já que estão vivos. Que coisa mais maluca? Pense. A vida já é um prêmio.
Tenho pensado que devemos cuidar esse sentimento dentro de nós. Aprender e valorizar em nós e nos nossos filhos o orgulho por fazer bem feito, por cumprir os nossos deveres. Não pela obrigação, ou porque não há alternativa, mas porque isso nos enobrece, literalmente nos torna nobres, no melhor sentido dessa palavra. E só ler, como sempre, o maravilhoso Aurélio ([Do lat. nobile.] Majestoso, augusto. Elevado, alto, sublime. Generoso, longânime, magnânimo). Assim, fazer o que devemos, gera em nós um orgulho que nos sustenta de dentro para fora. E nos dá independência sobre o outro. Nos firma. Fazer o que devemos, sem sentimentos de sacrifício, deveria ser o que mais gostássemos de fazer. O que mais ensinássemos aos nossos filhos. Porque só nós faz bem. Nos traz uma felicidade tão grande e douradora que nenhuma indulgência é capaz de competir. Acredite, experimente.
sábado, 20 de setembro de 2008
Fazer o que gosto ou fazer o que devo? Por que não gostar de fazer o que devo?
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